O conceito de autonomia vem sendo discutido por diversos autores, sob diferentes perspectivas, que incluem desde as mais individualistas até aquelas que tratam a autonomia do ponto de vista da inclusão dos sujeitos, estabelecendo relações na sociedade.
Mesmo sabendo que a questão da autonomia tem suas origens em espaços e tempos anteriores aos da contemporaneidade e de nosso país, seria impossível iniciarmos uma reflexão sobre esse termo sem recorrermos a um dos seus mais importantes legitimadores: Paulo Freire.
Para Freire, o conceito de autonomia é ponto fundamental, já que, além de explorá-lo em vários momentos, dedica uma de suas obras – Pedagogia da Autonomia (1996) –, para um aprofundamento desse conceito que, para o autor, é colocado enquanto um pressuposto pedagógico dos educadores progressistas.
Especialmente nessa obra, Freire (1996) ressalta a autonomia como algo construído a partir do desenvolvimento do sujeito histórico, da liberdade e da democracia.
Em geral, a maioria dos estudos sobre esse tema segue a linha freireana e leva em conta a participação social, acompanhada pelo anseio da promoção de uma maior participação política, de uma possibilidade de descentralização do poder e da ideia de que não há necessidade de separação entre um ser autônomo e um ser que atua colaborativamente.
É justamente nesse sentido que pensamos a autonomia na Educação, a partir de uma abordagem que considere questões de cidadania, além de atitudes que estimulem o aprendizado conjunto, muitas vezes por meio da pesquisa.
Entretanto, quando refletimos sobre toda essa teoria em nossa área, a pergunta que nos surge é: será que no ensino de Ciências, na modalidade regular, uma abordagem investigativa pode estimular a autonomia dos(as) professores(as) e alunos(as)?
Colocamos nossas ideias com relação a uma possibilidade de promoção de autonomia na Educação, pelo viés de um tipo de pesquisa em sala de aula. Sabemos, porém, que ainda temos muito a caminhar para compreender como esse conceito efetivamente pode ser promovido. Será que a questão da autonomia já surgiu atrelada ao campo da Educação?
Vamos dar um primeiro passo? Que tal observarmos a origem dessa aproximação?
Agora, convidamos você a conhecer um pouco mais sobre as relações entre a promoção da autonomia e seu contexto de emergência, a partir de um vídeo que traz a opinião de especialistas no assunto:
Vídeo Pedagogia Unesp - Autonomia na Escola (2010)
Na compreensão de Freire (1996), a conquista da autonomia deve partir de um trabalho conjunto "do professor com seus alunos e não do professor consigo mesmo." (FREIRE, 1996, p. 71). Nesse sentido, o(a) professor(a), para respeitar e promover a autonomia do(a) estudante, deve primeiramente pensar em sua prática educativa.
Entendemos a autonomia, assim como Freire (1996), constituída nas nossas práticas junto aos(às) nossos(as) alunos(as), na reflexão dos nossos modos de aprender e ensinar. Porém, conforme já discutimos quando abordamos a questão da contextualização, há problemas em nossa própria formação que se refletem nas nossas supostas tentativas de promoção de autonomia.
Talvez o principal desses problemas seja que a natureza da prática de investigação vivenciada nas atividades de pesquisa na área de Ciências parece ser esquecida nas atividades de ensino. Assim, conforme discutimos em busca da superação dos desafios anteriores, uma das possibilidades dos(as) professores(as) de Ciências para fazer surgir abordagens que levem em conta a autonomia dos sujeitos nas práticas de ensino-aprendizagem parece ser a superação dos modelos tradicionais de ensino, que priorizam a transmissão de informações e conhecimentos de forma autoritária e acabada, sem evidenciar os processos, dúvidas e contradições que contribuem para o avanço do conhecimento científico, transformando os(as) estudantes em agentes passivos do processo educacional (DELIZOICOV et al, 2007; CACHAPUZ et al, 2005). Com a superação desse modelo transmissivo de ensino, possivelmente o(a) aluno(a) terá uma maior abertura para opinar a respeito dos conceitos de ciência em outros âmbitos que não os escolares.
Outra questão que já assinalamos em momento anterior, e que se refere também à promoção de autonomia por parte dos(as) professores(as), encontra-se no livro didático. Mesmo que nem todos os(as) estudantes(as) sigam à risca os seus capítulos ou seções, esses materiais são indiscutivelmente utilizados por nós, professores(as), como base da maioria de nossas aulas, mesmo que nos cursos de formação inicial frequentemente a crítica ateste o contrário. Porém, é na prática efetiva de sala de aula que nós, professores(as), na maioria das vezes – com tempo muito escasso, com volumes assoberbantes de conteúdos e questões salariais desvalorizantes – nos apegamos a esses materiais que, se não forem analisados com um olhar mais crítico, podem ser mais uma das vias, se não a principal, de reprodução de histórias únicas, focadas no produto e sem abertura para compreensão ampla do processo de construção da ciência. Esse tipo de abordagem pouco corrobora para a ascensão dos processos em que nós e nossos(as) alunos(as) tenhamos uma formação científica voltada não somente para os conhecimentos estabelecidos e legitimados, mas para os processos que podem colocar em jogo, inclusive, nossos entendimentos acerca dos conhecimentos científicos no cotidiano, a partir de análises, interpretação de dados, diferentes níveis de argumentações e negociações de ideias, tão próximos aos do âmbito da construção dos conhecimentos científicos em questão.