Vamos agora focar um tipo de jogo específico: os jogos de RPG. A sigla para Role Playing Game (RPG) pode ser traduzida, grosso modo, como “jogo de interpretação de papéis”.
Nessa categoria vastíssima de jogos – porque há inúmeros estilos a explorar, que utilizam baralhos, tabuleiros, rodas de história –, os(as) jogadores(as) fingem ser os(as) personagens para resolver quebra-cabeças, sair de labirintos imaginários, solucionar problemas, salvar populações inteiras ou mocinhas indefesas, e o sucesso ou fracasso pode ser determinado por dados ou contas matemáticas.
Esse fingimento não nos lembra nada na literatura?
Os poetas árcades, que criavam nomes clássicos para escrever e se vestiam como tal, ou a heteronímia em Fernando Pessoa, já mencionados anteriormente, são alguns exemplos desse fingimento. De fato, são muitas as possíveis relações que se pode fazer entre o fingir e a criação literária.
Poderíamos dizer que, de certa forma, o(a) autor(a) que se coloca diante de uma folha em branco para escrever é muito semelhante ao(à) ator(atriz) que desempenhará um papel no palco.
Esse detalhe tão óbvio da criação literária nem sempre se faz claro, o que justifica o fato de alguns(as) leitores(as) iniciantes, nos primeiros anos do Ensino Fundamental, confundirem o(a) autor(a) e o(a) narrador(a), o(a) escritor(a) e as personagens.
O jogo que mencionamos anteriormente, a saga A Lenda de Zelda, o qual já existe há 25 anos, pode ser considerado uma variação desse estilo. Jogos dessa matriz, ou seja, que têm um herói incumbido de uma missão, atravessando várias aventuras (quest e sidequest), já foram amplamente explorados pela indústria de games e também pela literatura, nos chamados romances de formação, nos quais o herói vai se modificando ao longo da narrativa, do desenrolar dos capítulos.
Na rede social Facebook, por exemplo, podemos encontrar uma série de jogos freeware que se dividem em diferentes categorias, tais como: estratégia, ação, aventura e mesmo quebra-cabeças.
Essa saga é interessante porque a linha do tempo no jogo é toda ramificada de maneira que um jogador adulto, de 29 anos, que conheceu a história através de Zelda: um Elo com o Passado (1991), leu uma parte posterior da história a um menino que o tenha jogado num dos últimos episódios Zelda: Ocarina do Tempo (1998), com 12 anos. A linha do tempo do jogo é toda alinear, porque há um episódio, em um dos jogos, em que a personagem principal, excluída dos demais episódios por não ter uma fada protetora, precisa amadurecer precocemente para salvar seu povo, envelhecendo sete anos e criando assim duas histórias, com tempos diferentes, dentro da mesma narrativa.
Não se fala aqui, portanto, do tempo cronológico e lógico do relógio, mas sim de uma noção de tempo borgiano, espiralado, em que possuímos todas as idades numa mesma vivência. A personagem carrega dentro de si a infância e a adolescência numa espiral.
