Sabemos que os jogos digitais, cada vez mais, fazem parte das vidas de muitas crianças, adolescentes e jovens que estão em processo de formação. Justamente por esse motivo, professores(as) e gestores(as) não podem mais ignorar sua presença e influência no currículo escolar, mesmo que de maneira indireta.
Inicialmente, retomamos o conceito de currículo, para que melhor possamos compreender o porquê de propormos a inserção dos jogos digitais no ambiente escolar como um mediador da aprendizagem.
Segundo as Diretrizes Nacionais da Educação Básica (BRASIL, 2010), o currículo “configura-se como o conjunto de valores e práticas que proporcionam a produção, a socialização de significados no espaço social e contribuem intensamente para a construção de identidades socioculturais dos educandos”. Percebendo esse movimento que integra o currículo escolar e as práticas sociais, não podemos deixar de refletir sobre o espaço dos jogos digitais nesse contexto.
Nos últimos anos, cresceu o interesse de muitos pesquisadores em compreender o aprendizado baseado em jogos, que tem ganhado espaço nas escolas de muitos países da Europa e da América do Norte devido ao sucesso que apresenta no treinamento militar e industrial.
Parte-se da interpretação que, se bem utilizadas, as simulações ilustradas nos jogos digitais podem trazer grandes contribuições pedagógicas no que se refere ao aumento das estratégias de leitura visual de imagem e de leitura do espaço tridimensional; reforço da aprendizagem através da observação e comprovação de hipóteses; desenvolvimento da linguagem e alfabetização (inclusive em outros idiomas), dentre outras.
No Brasil, o espaço dos jogos digitais no currículo escolar ainda é muito pequeno, em parte devido à pouca discussão sobre seus princípios de aprendizagem, e em parte devido à noção comum de que são destinados apenas ao entretenimento e passatempo daqueles que os jogam.
Conforme vários pesquisadores dessa área de estudo, as investigações feitas até o momento apontam que o uso dos jogos digitais, além de proporcionar o desenvolvimento de habilidades e a compreensão de conteúdos, gera outras ricas aprendizagens através da experiência de jogar. Nessa perspectiva, esses teóricos têm se preocupado em compartilhar seus resultados e conclusões de forma a demonstrar como os jogos digitais possibilitam o exercício e aprimoramento de várias habilidades técnicas, motoras, cognitivas, emocionais e sociais, o que gera muitas possibilidades de utilização dos games em diversas situações, inclusive no ambiente escolar.
Fonte: Video games and learning - imagem da capa do livro.
Acreditamos que muitos dos jogos digitais, com finalidade pedagógica ou não, promovem aprendizagem interdisciplinar por meio da simulação de ações reais e do incentivo à resolução de problemas, articulando o interesse dos estudantes com conteúdos que são ensinados em algumas disciplinas. No entanto, nem todos nos permitirão explorar um ponto de vista transversal.
Compreender que, a partir da interação com os jogos digitais, os estudantes se tornam agentes de mudança ativa, e que, através de suas ações e motivação, transformam a situação problemática em aprendizado e solução é o primeiro passo para se pensar o currículo escolar integrado a práticas pedagógicas com os games.
Ao contrário dos tradicionais livros didáticos, esses jogos permitem a construção do conhecimento a partir de experiências interativas com conceitos básicos do currículo. Significa dizer que os estudantes aprendem de maneira contextualizada e significativa e, mesmo que indiretamente, reconectam conteúdos disciplinares com seus respectivos contextos.
A pesquisadora Dra. Maria Kobayashi propõe pensar nos games como aliados da educação, tendo como suporte fundamental a mediação dos professores e professoras para proporcionar aprendizagens significativas por meio dos jogos. Assista a entrevista com a pesquisadora aqui.
Por meio das reflexões feitas até o momento, podemos compreender que os jogos representam uma rica fonte de experimentação e sociabilidade, que transforma o currículo cada vez mais, na medida em que cumpre as seguintes funções:
O que podemos perceber é que o uso dos jogos digitais vai além dos aspectos puramente lúdicos ou pedagógicos, uma vez que não se aprendem só conteúdos curriculares ou estratégias de resolução de problemas, nem se passam apenas bons momentos de divertimento e descontração, mas se aprende a atuar em meio a uma nova cultura, a cultura digital. Nesse sentido, é fundamental compreender os diferentes aspectos que devem ser observados no uso dos jogos digitais, de modo que se possa ter clareza e compreensão pedagógica para permitir que tal prática seja validada e mensurável no desenvolvimento de crianças e adolescentes.