As tecnologias de linguagem são históricas e, quando surgem, tendem a moldar todo o cenário social, psíquico, perceptivo e cognitivo. Assim foi com a tecnologia de Gutenberg, ou seja, a invenção da prensa manual, em 1455, que abriu os horizontes para a história do livro. Do século XV até o século XIX, o livro impresso reinou soberano como forma privilegiada de produção e transmissão do saber e da cultura.
A partir do século XIX, as tecnologias reprodutivas, inauguradas pela fotografia e cinema, foram seguidas pelas tecnologias eletrônicas como o rádio e a televisão, que consolidaram a cultura de massas, naquilo que foi também chamado de era da imagem. Ambas as culturas, do livro e de massas, conviveram paralelamente até os anos 1980, quando a cultura do computador emergiu com força cada vez mais explosiva.
Ao surgir, uma tecnologia de linguagem tende a preponderar sobre aquelas que lhe antecederam. Assim foi com o livro em relação à cultura oral, assim foi com a cultura de massas em relação ao livro e assim também está sendo com as tecnologias digitais de informação e comunicação em relação a todas as outras tecnologias de linguagem. Embora as tecnologias anteriores ainda estejam atuantes na cultura, as tecnologias digitais tendem a roubar-lhes a visibilidade.
Não é para menos; enquanto a introdução da prensa manual afetou apenas um estágio da comunicação cultural - o da distribuição - e as imagens técnicas, como a fotografia, cinema, televisão e vídeo colocaram em evidência a visualidade, agora a revolução midiática do computador implica todos os estágios da comunicação, tais como a aquisição, a manipulação, o arquivamento e a distribuição, além de afetar todos os tipos de mídias: textos, imagens fixas, imagens em movimento, som e construções espaciais, na constituição da linguagem que impera em nosso tempo: a hipermídia.
É preciso, no entanto, considerar que nenhuma tecnologia de linguagem emerge abruptamente. Sua genealogia vai se insinuando gradativamente até que se dê o aparecimento de uma tecnologia que lhe seja inteiramente propícia. Isso é o que sucedeu com a linguagem hipermídia.
O jornal já havia imprimido profundas modificações na natureza da linguagem escrita, ou melhor, na sua forma. Pode-se dizer que os primeiros sinais para a expressão alinear da hipermídia já emergiram em 1844, com a invenção do telégrafo.
A descontinuidade do telégrafo ajudou a dar forma ao jornal moderno, quando relatos de eventos passaram a ser transmitidos de um lado a outro do planeta e a primeira página do jornal tornou-se um diagrama composto de imagens, manchetes, leads das notícias e matérias em colunas relativas a muitos momentos e eventos do dia anterior em todo um país e mesmo no mundo. Essa estrutura de linguagem pressagiou as qualidades da era digital.
Do jornal, passamos para as mídias eletrônicas, nas quais também podem ser encontrados traços antecipadores das configurações que a linguagem humana iria encontrar nas redes digitais. A sintaxe que é própria do vídeo, e que também aparece em programas de televisão como os do canal MTV (Music Television), por exemplo, está na habilidade desse meio para apresentar simultaneamente diversas histórias diferentes justapostas por cortes curtos produzidos pela edição eletrônica. De fato, o vídeo desafiou nossa capacidade sensória com imagens vívidas, cortes rápidos e sons eletrônicos intensos, preparando nossa sensibilidade para o mundo digital em devir cuja linguagem prototípica é a hipermídia, cujas partes integrantes são o hipertexto e a multimídia.